A princípio, o ser humano que deseja alcançar seus sonhos em vida naturalmente tem medo. Vivemos quase que numa constante batalha interna entre o que queremos e o que tememos.
Sobretudo, o esportista, jogador ou praticante de atividade física que busca a alta performance, defronta-se com as mesmas questões internas que os não atletas. Bem como, há um processo de aprendizado em todo esporte, e ele por vezes traz dúvidas sobre estarmos no nosso melhor ou não.
Tal como nos treinos, precisamos de pequenas doses de medos diários para podermos evoluir. O atleta teme a lesão, teme a derrota, teme a falta de confiança de não conseguir executar os movimentos perfeitamente. Isso é o padrão de qualquer pessoa. Portanto, para o atleta, é preciso encontrar a sua maneira de lidar com as inquietações que surgem em sua mente.
Contudo, a pesquisa na área nos mostra o que as pessoas fazem para dominar seus medos. A ansiedade, a depressão, são fatores que acompanham esses medos, geralmente. Para lidar com isso, médicos e psicólogos buscam entender os medos de pacientes e transformá-los em pequenos problemas administráveis, a fim de que as pessoas possam expor-se aos seus medos de maneira regular.
Quando isso acontece, o que observamos é que as pessoas não tendem a esquecer seus medos completamente, mas sim ficarem mais corajosas. Quando grupos de pacientes foram colocados em situações de stress voluntariamente, notou-se que usavam um sistema psicofisiológico completamente diferente daqueles que não sabiam qual tipo de stress enfrentam. Esse sistema está ligado à área de desafios e aproximação no cérebro. Os seres humanos gostam de desafios, tanto os mais simples quanto os mais perigosos, onde a linha que nos separa da morte é bem sutil.
Qual o tamanho do seu medo?
A surfista Maya Gabeira que o diga. Maya surfou duas vezes a maior onda do mundo em Nazaré, uma praia de Portugal. O tamanho do seu medo era 22,4 metros e pesava 150 toneladas. Antes de conquistar tudo isso, Maya foi derrubada da prancha pela força da água e no impacto da queda teve seu tornozelo quebrado. O colete salva-vidas também acabou se soltando. Ela foi salva inconsciente pelo também surfista de ondas grandes Carlos Burle.
Maya felizmente recuperou-se bem do seu acidente. Ela com certeza aprendeu algumas lições com os eventos de sua vida. Tudo poderia ter sido melhor planejado para que sua vida não corresse tanto perigo, mas seu ímpeto pelo desafio foi maior, e também sua coragem.
Maya, mesmo em ótimo estado de saúde física, acabou sofrendo algumas consequências psicológicas como medo de estar em público, crises de vômitos e dores de cabeça. Ela passou por tratamento com um psiquiatra e medicação. Voltar a treinar em busca de mais resultados foi uma decisão fácil para Maya, mas concretizar levou muito mais tempo. Mesmo assim, o que percebemos do exemplo de Maya é que a coragem é um fator que aumenta, à medida que conhecemos o tamanho dos nossos medos.
Você não precisa correr riscos para enfrentar seus medos. O atleta tem medos muito particulares que podem inclusive vir da educação familiar.
O que a filosofia diz?
No livro Educação, o filósofo Bertrand Russel aborda o contato com o medo de duas maneiras. Ou quando criança somos ensinados a temer as coisas pelos nossos pais, ou instintivamente desenvolvemos medos próprios da nossa espécie.
Para o primeiro caso, Russell cita o medo de escuro, incutido nas crianças pelos pais, e o medo de baratas, sugerido pelos homens às mulheres, historicamente. Em relação aos medos instintivos, Russell e os cientistas da psicologia infantil descobriram serem os medos mais vagos e difusos como sombras, barulhos ligados a objetos mecânicos, como o simples abrir de um guarda-chuvas.
Com o tempo, percebe-se que a familiaridade com os medos instintivos vai trazendo a confiança que precisamos para perceber o que está ao nosso redor e seguir em frente. E aqui chegamos em um ponto crucial para entendermos como lidar com nossos medos no campo esportivo.
Ao mesmo tempo, o atleta que busca resultados tem em si uma divisão. Ele quer o sucesso, mas teme o caminho que terá que percorrer para chegar até lá.
Ele tem medo da dor dos treinos, de perder uma competição, de se lesionar, e sofre também com medos de gente comum, como sentir-se rejeitado pelos que torcem por ele, e ficar na solidão durante as derrotas.
Assim como a psicologia sugere que a instrução dos pais seja voltada a demonstrar o perigo sem apresentar o medo, também sugiro que treinadores e atletas tomem consciência do que temem, antes de começar a jornada. Compreender racionalmente o perigo é necessário, temer não.
Quebrar o receio em partes
Geralmente, quando algo nos causa ansiedade e medo pelo que pode trazer de resultado, temos o costume de focar no lado negativo dessa ação. De início, caso o atleta perca a competição para a qual vem treinando, automaticamente, ele consegue pensar em várias consequências negativas. Pode perder patrocinador, a torcida pode deixar de confiar em seu potencial, pode perder porque durante um lance acabou se machucando. Isso tudo são cenários ruins que só alimentam o medo.
Portanto, o que se quer aqui é focar no resultado positivo de uma ação que tememos, ao invés de focar no que de pior pode acontecer. O atleta deve visualizar, imaginar quantas situações boas viverá caso saia de sua zona de conforto e busque o êxito.
Igualmente, o medo do fracasso não deve ser o foco. O foco deve estar em lembrar que o oposto do sucesso não é o fracasso, e sim o conforto. É preciso agir em função do que queremos alcançar, mesmo que surja uma ponta de medo da responsabilidade que a mudança e o sucesso vão trazer para sua vida.
Logo, comece enfrentando pequenos medos, coisas que você considera como parte da vida normal de muitos, como acariciar um cachorro, ou andar de moto.
No entanto, não estou aqui incentivando a pilotagem sem autorização ou o carinho em Rottweilers bravos. Apenas mostrando que podemos gradualmente caminhar pelo desconhecido e sentir mais confiança.
Enfim, pense no que seria um medo mais comum que você tem. Quanto mais coragem você tomar, em pequenas doses, menos o fator misterioso do medo vai te assustar. Procure conhecer as suas limitações e onde você pode se machucar. Em vista disso, siga em frente, explore esse terreno desconhecido a passos curtos e perceba melhoria em sua vida pessoal e esportiva.
Me siga nas redes!
Curtiu o texto? Tem muito mais conteúdo voltado para alta performance esportiva no meu canal do Youtube. Inscreva-se e aproveite. Até o próximo artigo!